[RESENHA] Babel ou a necessidade de violência: uma história arcana da revolução dos tradutores de Oxford
Olá, leitores!
Páginas: 2024 | Autora: R. F. Kuang | Editora: Intrínseca | Ano: 2024 | Gênero: fantasia, ficção | Tradução: Marina Vargas | Classificação indicativa: +18
Babel foi uma leitura que acabou passando na frente das outras por eu adorar a escrita da autora. Aqui temos Robin Swift, nascido em Cantão, na China. Ele tem pais de nacionalidades diferentes e enquanto sua mãe é chinesa, seu pai é inglês. Pela morte da sua mãe ter sido repentina e devido a uma epidemia de cólera, ele é tirado, por seu pai, de seu país natal, para ser educado na Inglaterra. Sua infância e adolescência passa, então, a estudar línguas, especialmente latim e grego.
Sua dedicação é árdua, buscando agradar o pai, que apesar de saberem do parentesco, não há uma forma de tratamento paternal entre eles. Embora siga uma rotina que poda suas origens, é intrinsecamente importante que continue praticando sua língua natal, mesmo que suas raízes sejam ignoradas sob a visão de que vem de um ambiente bárbaro.
Os dias de infância e adolescência de Robin são permeados de estudos, mas ele também passa a realmente gostar do que aprende. Não são apenas leituras e aprender a língua, é sobre o significado da composição do que está escrito, como é feita, e de onde vem. Apesar de parecer complicado, Robin experimenta níveis de apreensão maiores quando ingressa na universidade de Oxford. Seus estudos são diferentes dos demais, e sua classe é composta por poucos alunos, sendo eles pessoas de outros países, contendo diferenciação no idioma materno.
[...] No decorrer de várias semanas, eles haviam se tornado o que Robin nunca encontrara em Hampstead, o que ele achava que nunca mais teria depois de Cantão: um círculo de pessoas a quem amava tanto que seu peito doía ao pensar nelas.Uma família.
A riqueza de línguas, até então, tinha sido uma surpresa para mim, mas o encontro de mais personagens fazia crescer ainda mais minhas expectativas. Robin e seus novos amigos agora estudam em Babel, na torre dos tradutores, com integrantes descritos como solitários. Seus primeiros estudos são sobre a etimologia das palavras. Foi a partir daí que comecei a reconhecer que eu não sabia nada de inglês, de qualquer outra língua, especialmente meu próprio idioma.
É muito simples reter o que se aprende durante a vida e achar que o significado direto de determinada palavra contém absolutamente tudo que precisa saber sobre ela. Mas então você inicia Babel e tudo isso cai por terra. Tudo passa a valer, a composição das palavras, prefixos, origem da língua, de onde se derivou, qual o significado original, como ela é interpretada e como deveria ser interpretada. O livro me fez ficar vigiando cada palavra que eu falava e de onde ela vinha. A simbologia por trás do que falamos nunca é tão simples, contendo um universo de influências para cada uma.
A leitura busca lógica e a encontra facilmente. Parece um quebra-cabeça complexo ou um diagrama onde não há números, e sim palavras. Em resumo, a etimologia está presente nele todo, o que me fez questionar até mesmo o próprio livro, por indagar as palavras, o que isso o torna? Uma composição lógica e complexa que faz quase 800 páginas consumirem minha mente.
Traição. Tradução significa exercer violência sobre o original, significa deformá-lo e distorcê-lo para olhos estrangeiros e não pretendidos. Então, como é que ficamos? Como podemos concluir, exceto reconhecendo que um ato de tradução é necessariamente um ato de traição?
Além disso, o livro ainda é uma fantasia, seguindo uma lógica com palavras e prata, dando ênfase em como é importante que os que trabalham com a magia das palavras saibam a língua como nativos, embora também tenham esses nativos meramente como pessoas que precisam ser civilizadas.
Os personagens são levados para a Inglaterra com este intuito, adquirindo seus costumes, embora tenham que manter seus idiomas preservados para trabalharem com a magia por trás da língua postas na prata, que funciona como um canalizador do significado da palavra, para manifestar sua essência e assim produzir a magia. Mesmo com este entendimento, o livro nos conduz a uma rede de significados bem amarrados, que mal pensei que fosse magia, e sim pura lógica. Mas ambos fazem total sentido, não deixando de evocar o real significado da tradução.
O livro é ambientado no século XIX, em um perfeito estilo de Dark Academia, que me fez suspirar imaginando tardes de estudo em um clima úmido, mas ao mesmo tempo convidativo para ler um livro com uma xícara de café. A leitura proporciona outros tipos de reflexão. Sendo uma autora de origem chinesa, Kuang constrói a narrativa sobre linguística também atrelada à sensação de pertencimento dos personagens, por terem sido tirados de seus países e moldados a aprenderem algo que coloque em desfalque suas verdadeiras identidades.
O inglês não apenas tomava emprestadas palavras de outras línguas; estava repleto de influências estrangeiras, um vernáculo frankensteniano. E Robin achava incrível como aquele país, cujo cidadãos se orgulhavam tanto de ser melhores do que o resto do mundo, não conseguia tomar um chá da tarde sem usar algo emprestado.
As reflexões não param por aí, mas o melhor é compreender esse raciocínio lendo este livro. Fiquei me questionando quem seria o vilão da história, mas isto é algo sutil e crescente. Pode ser um livro recente, mas traz diversos pontos a se pensar, principalmente sobre colonialismo, etnia e identidade. A violência destacada no título está nas nuances, e até mesmo nisso, o que parece pouco, é uma transgressão de histórias.
O livro promete causar impacto, e causou um certo impacto comigo. As últimas páginas me trouxeram uma sensação de desolação, mas entendo perfeitamente a escolha do desfecho. É um livro complexo e doloroso, que abre um caminho para reflexões necessárias de modos que talvez você nunca tenha cogitado.
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Oi, Levante! Como vai? Parece um livro fabuloso, né? Que bom que curtiu. Fiquei curioso. Abraço!
ResponderExcluirhttps://lucianootacianopensamentosolto.blogspot.com/
Eu quero muito ler esse livro! Ainda não li essa autora, mas já me fizeram recomendações positivas desse livro e outras obras dela. Quando vi que tinha críticas ao colonialismo, constatei que seria uma leitura perfeita para mim.
ResponderExcluirGarota do 330